sexta-feira, 9 de abril de 2010

Inflação no trimestre é a maior em 7 anos


Folha de São Paulo, sexta-feira, 09 de abril de 2010
PEDRO SOARESDA SUCURSAL DO RIO

P
ressionado por uma forte alta dos alimentos, o IPCA ficou em 0,52% em março, abaixo do 0,78% de fevereiro, graças apenas ao fim da correção sazonal das escolas. Tal resultado fez o índice em 12 meses acumular uma variação de 5,17%, acima do centro da meta do governo (4,5%) e superior a 5% pela primeira vez desde maio do ano passado.
No primeiro trimestre, o IPCA subiu 2,06%, maior taxa para o período desde 2003 (5,13%). No mesmo período de 2009, o índice fora de 1,23%.
Vilões do mês, os alimentos subiram de 0,96% em fevereiro para 1,55% e tiveram a maior variação mensal desde junho de 2008 (2,11%). Sozinho, o grupo alimentação contribuiu com 0,35 ponto percentual do índice geral, o que correspondeu por 67% do resultado.

No primeiro trimestre, os alimentos subiram 3,69%, mais que os 3,18% registrados em todo o ano passado.
Em março, as altas de destaque ficaram com tomate (42,95%), feijão-carioca (10,46%), batata-inglesa (8,44%), leite pasteurizado (8,03%) e açúcar refinado (6,32%).
Em parte, foram impulsionadas pelo calor e pelas chuvas em excesso. Há também, no entanto, pressões típicas do consumo maior de alguns itens, como o leite.
Inflação de demanda
Segundo Eulina Nunes dos Santos, o movimento de alta dos alimentos é "generalizado" e há sinais de inflação de demanda (quando os preços sobem devido à alta procura) em alguns produtos, embora a tendência não esteja clara ainda.
"A chuva e o calor têm prejudicado as lavouras, o que reduz a oferta. Com isso, os preços sobem muito. É o caso do tomate, por exemplo. Mas há a questão da demanda, que pode permear toda essa situação, mas não é evidente ainda."
Além do leite, mais consumido pela baixa renda neste ano, outro sinal de "inflação de demanda" vem das recorrentes altas da alimentação fora de casa, que subiu 0,57% em março.
"As pressões de demanda existem, mas elas não preponderam desde o início do ano", diz Fábio Romão, da LCA.
Em março, a inflação cedeu não só na esteira da ausência dos reajustes das mensalidades mas também por causa dos combustíveis. É que com o início da safra de cana-de-açúcar caiu o preço do álcool (-8,87% em março) e, por consequência, o da gasolina (-1,95%).
Para o economista da LCA, o IPCA vai entrar numa fase de "descompressão" e, aos poucos, convergirá para o centro da meta. A LCA projeta taxa de 4,7% ao final do ano, pouco acima do objetivo central de 4,5%.
Menos otimista, a Rosenberg & Associados avalia que há sinais claros de inflação de demanda e não estima desaceleração nos próximos meses -o que obrigará o Banco Central a subir os juros. A LCA espera elevação da Selic já neste mês.
"Com o movimento de preços livres em alta e a demanda cada vez mais forte, dificilmente a inflação arrefecerá até o final do ano", afirma a Rosenberg em sua análise.
Romão argumenta, por seu turno, que os preços no atacado já sinalizam para deflação, o que aliviará, nos próximos meses, as taxas no varejo.
O IGP-DI (Índice Geral de Preços - Disponibilidade Interna), divulgado ontem, registrou alta de 0,63% -abaixo do 1,09% de fevereiro. No atacado, os preços avançaram 0,52%, com deflação nos itens industriais (-0,05%). Já no varejo, o índice ficou em 0,86%, também pressionado por alimentos.

Estagflação versus hiperinflação

18 de março de 2010 15h34 Paul Krugman
Estou chegando ao debate com algum atraso, mas Mike Kinsley publicou um curioso artigo no The Atlantic no qual ele confessa seu pavor em relação à inflação futura, mesmo sem que haja indícios desse problema no mundo real. Ele não está sozinho: há muitas vozes prevendo uma hiperinflação iminente em 2009, ou melhor, 2010 (sim, eu estou acompanhando a questão).
Entretanto, o que quero comentar é o seguinte trecho da análise de Kinsley:
A hiperinflação ocorre quando a inflação alimenta a si mesma e foge ao controle. É possível ter uma inflação estável de 2% ou 3%. Mas é impossível uma inflação estável de 10%. Quando todos supõem uma inflação de 10%, todas as forças que produziram 10% avançam para 20%, e depois 40%, e em pouco tempo as pessoas se veem empurrando carrinhos de mão cheios de dinheiro, como nas famosas fotos da Alemanha de Weimar.
Bem, isso não está correto – ao menos, não de acordo com a ciência econômica tradicional, que estabelece uma distinção entre o tipo de inflação que atormentou a década de 1970 e a inflação do tipo visto em 1923 (ou recentemente no Zimbábue).
A hiperinflação é na verdade um fenômeno bem compreendido, e suas causas não são motivo de grande controvérsia entre os economistas. Trata-se basicamente de uma questão de renda: quando o governo não consegue aumentar os impostos nem captar empréstimos para pagar seus gastos, ele às vezes recorre à máquina de dinheiro, tentando obter renda a partir da criação de moeda. Isso leva à inflação, o que faz com que as pessoas tentem se livrar de suas economias, o que significa que as máquinas da casa da moeda passam a funcionar mais rápido para comprar a mesma quantidade de recursos, e assim por diante.
O tipo de inflação que tivemos na década de 1970, a famosa era da estagflação – uma alta inflação combinada a um alto desemprego -, era consideravelmente diferente. O problema não estava nos déficits – na verdade, os déficits americanos foram muito menores na inflacionária década de 1970 do que durante a desinflação dos anos 1980. Em vez disso, o que tínhamos era uma combinação entre políticas monetárias excessivamente expansionistas, com base numa visão irreal de até que ponto o desemprego poderia ser reduzido sem provocar uma inflação acelerada (a NAIRU, taxa mínima de desemprego condizente com uma inflação estável), e choques do petróleo que levaram a uma alta generalizada na inflação, graças às cláusulas associadas ao custo de vida amplamente difundidas nos contratos. Nunca houve o risco de hiperinflação; a única pergunta era se estaríamos dispostos a pagar o preço da redução da inflação em termos de um alto desemprego, e quando o faríamos.
Kinsley parece estar confundindo a lógica do desemprego estrutural, segundo a qual a estimativa de inflação é incorporada ao processo de definição dos preços, de modo que se torna necessária uma inflação em aceleração para manter o desemprego abaixo da NAIRU, com a lógica da hiperinflação, bastante distinta, que trata do problema das pessoas fugindo do dinheiro.
Enquanto isso, para aqueles que preveem uma hiperinflação, minha pergunta seria: qual é o aspecto dos Estados Unidos que parece diferir da situação japonesa de, digamos, 2000? Grandes déficits orçamentários e um alto endividamento? Estão presentes. Uma imensa expansão na base monetária? Aí está ela. E, ainda assim, o deflator PIB do Japão recuou 9% desde 2000.


sugestão: visualize o museu com foco de 125%